Óbidos,
vista á noite e com luz de
lanterna…
Por aqui já tinha visitado várias vezes, mas nunca á luz de um frontal e lanterna.
Chegamos a Óbidos de dia,
pois o levantamento do dorsal assim o exigia. Até há hora de colocar a lanterna
ainda deu para visitar a vila.
A primeira impressão de
Óbidos é uma imagem tradicional, com carisma. Porque, ao fundo, no horizonte,
se projeta o traçado de um castelo sobre o céu azul e porque tudo o mais que
existe nesta vila descobre dentro de portas. Com um vasto património de
arquitetura religiosa e vestígios histórico e monumentais, a vila de reis e
rainhas foi, noutros tempos, local de preferência para descanso ou refugio das
desavenças da corte.
Pensa-se que o Castelo de Óbidos é de origem romana mas
foi depois uma fortificação sobre domínio árabe. Classificado como Monumento
nacional apresenta um estilo arquitectónico e foi convertido numa pousada.
Por
entre muralhas, podemos apreciar e desgostar a ginjinha de Óbidos. Acredita-se
que a origem deste licor remonta ao séc. XVII, receita conventual, da qual um
frade tirou partido das grandes quantidades de fruto existentes na região. A
fórmula foi gradualmente difundida, passando o licor a ser confeccionado a
nível familiar por obidenses, orgulhosos de presentear ilustres hóspedes com a
melhor das ginjas. Mais ou menos doce ou ácida, é um ax-libris da vila que cede
a fama à noite de Óbidos.
Na zona, a uns quilómetros existe a Lagoa de Óbidos é
um dos mais bonitos locais da costa ocidental de Portugal, e constitui um
frágil ecossistema, onde diversas espécies encontram um privilegiado habitat.
Numerosas aves aquáticas e migratórias podem aqui ser observadas, mas é
sobretudo ao nível dos moluscos bivalves que reside a importância da fauna
desta área. Até ao final da Idade Média a Lagoa estendia-se até ao sopé da Vila
de Óbidos mas a evolução da linha da costa, numa constante mutação, limitou
substancialmente o seu perímetro. Ainda assim, a lagoa tem uma extensão
apreciável sendo local excepcional para a prática de diversos desportos como o
remo, a vela e o windsurf.
A hora ia chegando, mas ainda dava para ver outros aventureiros partirem e no inicio de cada prova a banda dos amigos da música animavam os atletas.
Até se poderia dizer que as vistas são magníficas
(porque naquele local de facto são), não fosse o caso da corrida ser à noite e
não dar para ver grande coisa, à excepção daquelas dezenas de metros que a luz
do frontal ilumina à nossa frente.
Contudo, não me vou esquecer tão cedo das
sombras provocadas por entre trilhos e montes, ou a auto via formada pelas
centenas de luzes dos atletas que ainda vinham na outra margem do rio.
No escuro, as pedras e raízes causadoras de 90% das
quedas em trail tornam-se ainda mais desafiantes e exigem um nível de
concentração ainda maior.
Orientar foco para a frente para ver os ramos,
orientar foco para baixo para ver o chão e, ao mesmo tempo, não perder de vista
os quadradinhos reflectores e as fitas que indicam o caminho. Sei também que a ilusão de ser “já ali” não passa
disso, uma ilusão. Nós não conseguimos ver, mas o caminho segue em curva e
contracurva, e o abastecimento entre um sobe e desce de trilhos.
Passando o abastecimento, mais de 10km estão feitos e
sei que, a não ser que algo de muito mau aconteça, pensei,
vou conseguir bater a minha marca de tempo. Ahahah! Somos tão inocentes às
vezes... Já devia saber que não se pode fazer contas numa prova de trail,
quem manda é a natureza. Neste caso, a natureza impiedosa da escuridão. Por acaso o meu frontal fraquinho que tinha ganho num
urban trail e ainda alimentado a pilhas dos chineses até se estava a portar-se
bem. Tinha era de alternar entre apontar o foco mais para baixo, em zonas de
piso mais irregular, para poder ver melhor onde punha os pés e entre apontar o
foco para a frente, para poder reflectir nos pequenos quadradinhos
sinalizadores que indicavam o percurso.
Por vezes sozinho. Que surpresas estariam reservadas nos quilómetros
seguintes? Uma pessoa fica viciada neste carrossel de emoções que são as provas
de trail, em que num momento estamos no topo do mundo e no outro maldizemos
tudo e todos e no outro somos felizes e no outro miserável.
Ainda ficam umas palavras para a chegada ao castelo de
Óbidos, que consistia em nada mais a entrada pela porta da vila e passar por
entre transeuntes que nos aplaudiam a nossa chegada até ao momento de pisar a
passadeira vermelha.
Foi uma tarde e noite de emoções, tanto para mim como
para a mãe, que enfrentou o vento no alto do castelo enquanto me esperava.
Então para o mais pequenote, o ponto alto da noite, o privilégio de tirar uma
foto com o Senhor da recolha do lixo e o respectivo camião.
O TNLO (Trail Noturno da Lagoa de Óbidos) não tem grandes altitudes, mas um sobe e desce
de trilhos constante torna-se num “falso fácil”, e se não houver cuidado
torna-se difícil, já dizia Jorge Serrazina antes da prova.
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